Exposição no Sesc 24 de Maio traz a história do Hip-Hop em São Paulo
HIP-HOP 80’sp – São Paulo na Onda do Break traz mais de 3 mil peças originais reunidas pelos curadores, artistas que participaram do movimento
Denize Bacoccina
A memória do Hip-Hop anda meio perdida no lugar em que ele nasceu em São Paulo, na esquina da Rua Dom José de Barros com a Rua 24 de Maio. Metade do calçadão é hoje ocupado indevidamente por viaturas de polícia, reduzindo o espaço dos pedestres e, de certa forma, diminuindo o espaço de expressão popular do local, que segue sendo um ponto de encontro. Do outro lado da rua, porém, será possível ver como tudo começou e como a cena Hip-Hop se desenvolveu em São Paulo. O Sesc 24 de Maio abre nesta quinta-feira, dia 24 de julho, a exposição HIP-HOP 80’sp – São Paulo na Onda do Break,aberta para visitação até 29 de março de 2026.
Quarenta anos depois do início dessa expressão popular, em meados dos anos 1980, o público pode embarcar numa jornada que traz mais de 3 mil peças reunidas pela primeira vez, contando a história de jovens periféricos que beberam na fonte dos americanos e criaram uma arte própria, que se transformou numa revolução urbana envolvendo arte visual, música e comportamento.
Curadores
HIP-HOP 80’sp tem idealização e curadoria compartilhada por vozes e testemunhas da cena, como OSGEMEOS, Rooneyoyo O Guardião, KL Jay (DJ histórico dos Racionais MC’s), Thaíde, as pioneiras Sharylaine e Rose MC e o b-boy ALAM Beat. A produção executiva é de Camila Miranda e Ricardo Samelli e a realização é do Sesc São Paulo.
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As mais de 3 mil peças apresentadas são oriundas de coleções pessoais, como a do Nelson Triunfo, Billy, Pierre, Ricardinho e Renilson do grupo Electric Boogies, além de acervos históricos nacionais e internacionais, incluindo registros inéditos da fotógrafa Martha Cooper – que documentou o nascimento do Hip-Hop em Nova York –, o documentário Style Wars (1983) de Henry Chalfant, obra fundamental sobre a cultura Hip-Hop, e gravações exclusivas do artista visual Michael Holman, que imortalizou as primeiras batalhas de break. Somam-se a essas relíquias equipamentos de som originais, flyers de bailes black, roupas de época, colaborações do Museum of Graffiti (Miami) e outros objetos que testemunham uma era em que o improviso se reafirmou como linguagem criativa.
A mostra começa com a cena novaiorquina de Hip-Hop, no fim dos anos 1970, e traz fotos de grafites e pichações da época, em muros, vagões de metrô e outros espaços, a cultura dos DJs. “Eu comecei a acompanhar a cena de fora, fotografando as obras, e demorou um tempo até que eles acreditassem que eu não era da polícia e confiassem em mim”, contou ao A Vida no Centro o fotógrafo Henry Chalfant. “Até porque eu já tinha 40 anos e eles eram adolescentes.”
No salão seguinte, é possível ver “como tudo começou” em São Paulo, a influência dos filmes (Beat Street, Breakin’ etc). Um painel traz uma reprodução da estação São Bento, o epicentro Hip-Hop paulistano. São expostos ali, além de fotos e vídeos, muitas capas de disco, roupas de músicos pioneiros na música black e compreender a cena artística do começo dos anos 1980.
Veja galeria de fotos que estão em exposição:
São Bento
Além dos objetos originais, a área central da exposição recria a São Bento dos anos 1980, incluindo um vagão de metrô cenográfico, onde serão realizadas oficinas de DJ, Hip-Hop, grafite, dança e rodas de conversa, numa tentativa de mostrar às gerações mais jovens a importância desse movimento cultural. Na parede desta sala, uma instalação com dezenas de aparelhos, telas com imagens, manequins com roupas da época e outros objetos formam um boombox gigante.
Gustavo Pandolfo, um dos irmãos da dupla d’OSGEMEOS, também responsáveis pela organização da exposição e fornecedores de muitas peças em exposição, conta como foi viver aquela época. “Fizemos Hip-Hop sem saber que fazíamos Hip-Hop. Era expressão de liberdade, resistência, diversão e sobrevivência.”
Rooneyoyo O Guardião, figura marcante do Hip-Hop paulistano dos anos 1980, e também curador da exposição, destaca a importância do movimento para o grupo, formado principalmente por jovens periféricos. “Essa cultura nos salvou. Criou um lugar para a gente sonhar”, conta Rooneyoyo. Ao lado de amigos, ele percorreu arquivos pessoais, reconectou trajetórias e garantiu a presença de vozes e objetos essenciais para a reconstrução da narrativa na mostra, ajudando a transformá-la em uma homenagem legítima e pulsante à cultura que emergiu das ruas.
Duas mulheres, Sharylaine e Rose MC, também compõem a equipe curatorial e trouxeram seu olhar para a presença – e ausência – das mulheres na cena Hip-Hop. Pioneiras, elas trazem a lembrança de que o movimento nem sempre era aberto às mulheres, e que tiveram que romper barreiras para fazer parte. Sharylaine, reconhecida como uma das primeiras-damas do rap nacional, fundou o grupo RAP Girls e segue ativa com uma trajetória marcada por lirismo e militância. “O Hip-Hop é a minha religião. A rima é minha oração”, diz ela. Rose MC se define como “uma das pioneiras no Hip-Hop, B.Girl, rapper e mulher da cultura de rua”, expressando em sua própria trajetória o enraizamento e a longevidade dessa presença feminina na cultura urbana.
Veja vídeos com outros curadores da exposição.
Origem do termo Hip-Hop
O termo Hip-Hop tem raízes linguísticas antigas, derivadas de onomatopeias que remetem a movimento e dança. A expressão foi cunhada no final dos anos 1970 por artistas que incorporaram a cadência do “Hip Hop/Hip Hop” nas performances de palco, como os rappers Cowboy e Lovebug Starski.
Nos Estados Unidos a cultura se espalhou a partir do sul do Bronx, chegando depois ao Brooklyn, Queens e Manhattan. Impulsionado pela televisão e pela cultura pop, o Hip-Hop chegou ao Brasil em videoclipes, novelas, videocassetes e imagens em referências que foram sendo retrabalhadas pelos brasileiros. Apesar da gênese paulistana enfatizada na exposição, a cultura alcançou também outros estados, também representados na exposição. “Nós pensávamos que estávamos criando uma coisa única, mas depois vimos que em outros estados outras pessoas também estão criando, na mesma época”, conta Rooneyoyo.
SERVIÇO:
Exposição: HIP-HOP 80’sp– São Paulo na Onda do Break
Curadoria: OSGEMEOS, Rooneyoyo O Guardião, KL Jay, Thaíde, Sharylaine, ALAM Beat e Rose MC
Período expositivo: até 29 de março de 2026
Horário de funcionamento: terça a sábado, das 9h às 21h; domingos e feriados, das 9h às 18h
Local: Sesc 24 de Maio – Rua 24 de Maio, 109 – República
Classificação Livre | Entrada gratuita
Agendamento de visitas para grupos: agendamento.24demaio@sescsp.org.br